Vingança - trecho

A luz era filtrada por grossas cortinas, deixando o ambiente na penumbra. Os móveis eram de madeira-de-lei escura, grandes, pesados. O cômodo era grande mas cheio de estantes de livros e com duas escrivaninhas e um canapé espaçoso, onde dois rapazes conversavam.
- Seu pai queria que você esquecesse esse assunto.
- Eu sei. Se não fiz nada até hoje, foi em respeito a ele. Mas já fiz luto por um ano, não tenho porque esperar mais.
- Podia atender o desejo dele.
- Eu não queria dar-lhe desgosto mas agora ele não está mais aqui para desgostar-se. Eu preciso fazer isso, Álvaro.
- Não entendo porque não consegue esquecer tudo.
- Esquecer?! A minha vida mudou totalmente, você acha que posso esquecer?!
- Mudou para melhor, não?
- Não importa. Eles não tinham direito. Não tinham direito...
- A Ângela já sabe?
- Não. Nem deve saber. Você é o único que sabe. Então é o único que pode me deter. Mas é também o único que não tentará me deter.
- Você vive obsecado com essa idéia. Esqueça, Rodrigo, perdoe!
- Nunca: eu jurei vingança. E eu terei minha vingança.
- Já sabe o que fará?
- Não, não sei em que situação vivem. Preciso estar lá para decidir.
- Não faça nada de que possa se arrepender depois.
- O que quer que eu faça, não será motivo de arrependimento.
- Eu não sei como convencê-lo a não ir.
- Não sabe porque não há como. Eu partirei na próxima semana. Já tenho tudo planejado até chegar lá. Então verei o que fazer.
- Rodrigo, você é jovem, rico, tem uma noiva linda, por que ficar repisando coisas do passado?
- É uma ferida que não fechou, Álvaro. É preciso pôr remédio para que cicatrize.
- E vingança é remédio?
- Para mim, é. Você fala tudo isso porque não sabe o que aconteceu.
- Eu sei: você me contou.
- Você não sabe o que eu sofri, o que eu passei. Eles merecem todo o que eu darei a eles. Eles pagarão muito caro pelo que me fizeram.
Álvaro desistiu: sabia que a esperança da vingança era o que mantinha Rodrigo vivo. E, apenas quando se sentisse vingado, ele poderia viver em paz, como uma pessoa normal. Enquanto restasse essa mágoa, ele estaria sempre angustiado, amargurado, melancólico.
- Então, que você tenha sucesso, e que sua sede de vingança seja saciada.
- Deus permita.

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